O
Tantra sempre esteve associado às práticas de magia, ao xamanismo e às antigas crenças de fertilidade dos
povos Orientais. Os especialistas do Ocidente sempre tentaram associar as
crenças tântricas com superstições incompreensíveis. Sua repulsão, em parte
intelectual foi devido a acreditarem ter superado as crenças mágicas dos seus
antepassados. E para complicar ainda mais seu estudo, o Tantra tem a faculdade
de provocar a indignação moral de alguns e abalar as raízes da cultura judaico-cristã
e budista tradicional. Os racionalistas pretendiam que nas doutrinas budistas,
por exemplo, as práticas tântricas fossem consideradas uma degeneração da
filosofia original. Em realidade os poderes psíquicos extraordinários e os
milagres nunca foram postos em dúvida entre os budistas. Para aqueles que
tinham capacidade necessária, o cultivo de tais poderes formava parte do
programa de iluminação, enquanto para outros era uma benção discutível. A
existência de muitas classes de espíritos incorpóreos e a realidade das forças
mágicas, ambos eram considerados indiscutíveis e as crenças neles fazia parte
de uma cosmologia comum.
É difícil estabelecer quando se
iniciaram as práticas tântricas. Como se tratam de doutrinas herméticas, de
mistérios, seus seguidores tem preferido manter seus segredos. As ideias
ocultistas e esotéricas devem ter circulado em pequenos grupos de iniciados
antes de alcançar a luz do dia. Como um sistema de crenças mais ou menos
público, o Tantra adquiriu força depois do ano 500 ou 600 da nossa era.
Entretanto suas raízes encontram-se nos primórdios da história humana, quando
as sociedades agrícolas estavam mergulhadas nas práticas mágicas, nos
sortilégios de feiticeiras e xamãs, nos rituais de sacrifícios humanos e nos
cultos de fertilidade da deusa mãe e outras divindades ctônicas. O Tantra não é
uma criação nova, senão o resultado da absorção de crenças primitivas nas
tradições literárias hinduístas e depois sua mescla com a filosofia budista.
Como os hinduístas, os budistas
distinguem um Tantra “da mão direita” e outro “da mão esquerda” No hinduísmo os
“observadores da mão direita” (dakshinacarins)
dão mais importância ao principio masculino no Universo enquanto os
“observadores da mão esquerda” (vamacarins
- das palavras vama, “reverso, oposto, esquerdo; mau, vil”, mas também “belo,
agradável”, e cari , “aquele que vai, prossegue ou anda por um caminho” )
ao principio feminino. O termo “shaktismo”
está associado ao Tantra da mão esquerda. O “shaktismo” hindu está ligado ao shivaismo.
As doutrinas Shaiva tiveram
grande influência no “shaktismo”
budista. Shakti é a consorte divina,
energia criadora, potência feminina. No shivaismo
a adoração de Shakti está relacionada
com a esposa de Shiva – Parvati ou Uma – denominada também de “A
Grande Deusa”, e “A Grande Mãe”. Uma particularidade do shaktismo é que as divindades possuem uma manifestação benigna e
uma manifestação terrível conforme o culto. A manifestação terrível de Parvati é Durga, A inacessível, ou Kali, a Negra. As manifestações terríveis estão associadas à
morte, à destruição, e à necromancia, aos sacrifícios animais e humanos. Ao
mesmo tempo no shivaismo são inumeráveis as manifestações femininas
relacionadas à Maha-Kali (Tempo
Poderoso), Nytia-Kali (Tempo
Infinito), Shmashana-Kali (Kali do
Solo Abrasador), Raksha-Kali (Guardiã),
Shyama-Kali (A Negra).
Os textos sagrados dos vamacarins pertencem ao Tantra (“tear. Teia; veste; disciplina; manual; caminho certo”); eles remontam
ao período Gupta e posteriores e são na essência suplementos técnicos das
várias escrituras purânicas de Vishnu, Siva e da Deusa, sendo alguns do
“Caminho da Mão Direita” (dakshina) e
outros da Mão Esquerda.
No Tantra são
cultuadas Maha-Kali e Nytia-Kali. Quando não havia nem a
Criação , recitam os místicos hinduístas, nem existiam ainda o Sol, nem a Lua,
nem os planetas e nem a Terra, e quando as trevas estavam envolvidas nas
trevas, então a Mãe, a Sem Forma, a Maha-Kali,
o Grande Poder, era una com Maha-Kala,
o Absoluto.
Shyama-Kali tem um aspecto um tanto
meigo e é uma divindade protetora do
lar. Ela dispensa bênçãos e dispersa o medo. Nos tempos de epidemia, fome,
terremoto, secas e inundações, Raksha-Kali
é a deusa venerada pelas pessoas. Shmashana-Kali
é a manifestação do poder de destruição. Ela habita nos crematórios, cercada de
cadáveres, chacais e terríveis espíritos femininos. Da sua boca jorra uma
torrente de sangue, do seu pescoço pende uma grinalda de cabeças humanas e em
volta da sua cintura há um cinto feito de mãos humanas.
A manifestação feminina do Brahman, a Divina Mãe, depois da
destruição periódica do Universo possui um papel primordial, ao final do grande
ciclo do dia de Brahma, recolhe as
sementes para a próxima Criação. Ela é como uma anciã que tem um baú no qual
guarda seus artefatos domésticos. Esse poder primevo após a nova Criação habita
o próprio Universo. Ela emana este mundo dos fenômenos e então impregna-o com
sua energia fecundante. Prisão e liberação são seus atributos divinos. Através
de sua Maya os habitantes do mundo se
envolvem em “mulheres e ouro” e novamente, por sua graça, eles conseguem a
liberação. Ela é chamada a Redentora e a Removedora do cativeiro que prende a
pessoa ao mundo. Ela é obstinada e sempre tem que ter tudo à sua maneira, dizem
seus fiéis.
O Mistério
Cósmico de Maya tem três poderes. O
primeiro é de obscurecer e ocultar Brahman,
o Absoluto; o segundo, o de projetar a miragem do mundo e o terceiro é o de
revelar Brahman através dessa miragem,
que conhecemos como a ilusão do mundo dos fenômenos. Satyavati, uma das manifestações femininas descritas pelos livros
sagrados, em seu barco transportava iogues para a outra margem e nessa função
representava o poder revelador de Maya;
mas ela também transportava passageiros da margem de lá para a de cá e com isso
obscurecia e projetava. A serviço do desejo do bondoso rei Santanu, seduzido pelo seu perfume e ludibriado por sua falsa
virgindade, ficou com ela na margem de cá, e ela se tornou a força ativadora de
toda esfera e de toda a interação de luz e sombra no universo védico. Em uma
das margens está o campo de toda alegria e dor, virtude e vício, conhecimento e
ilusão, mas a outra margem do rio está além desses princípios complementares
até um absoluto que ultrapassa a concepção dos princípios. No meio do caminho
está a ilha, o mundo, a fonte do mito, que, em si mesmo, é tanto verdadeiro
quanto falso, tanto revelador quanto obscurecedor, e deve ser interpretado como
a própria vida, de acordo com o talento de cada um, de um ou de outro jeito,
como verdade literal, ou como alegoria de uma transição mais profunda.
O Tantra
apropriou-se do enorme panteão da mitologia popular, com sua imensa quantidade
de manifestações. Entretanto seus seguidores estavam de acordo com as
suposições metafísicas da sabedoria védica (prajnaparamita),
em que a realidade ultima da vacuidade (sunnyata)
é a única realidade, enquanto que qualquer classe de multiplicidade do mundo
dos fenômenos seria em última análise irreal e produto de nossa mente ignorante
e enferma. A multiplicidade de deuses seria então nada mais que uma ficção,
produto da imaginação, e nenhuma dessas divindades teria existência autônoma
sem a mente criadora do homem. A mente moderna, que se considera laica, no
Ocidente, poderia concordar com esse postulado se não fosse o aspecto de que
acreditamos que as coisas materiais ao nosso redor são reais e as divindades
são uma criação falha do intelecto humano devido ao resultado das decepções de
nossa vida intuitiva e instintiva perante aos acontecimentos da vida cotidiana.
Ao contrário, segundo o Tantra, tanto as coisas materiais, como as divindades
são irreais perante a grande vacuidade (sunnyata),
mas em seu conjunto, a mitologia representa uma espécie de referência que
vale muito mais que os dados da nossa experiência cotidiana, e quando manejados
adequadamente, nos ajudam de forma eficiente a alcançar nossa libertação das
ataduras da existência.
Para o
iniciado, como exige qualquer religião milenar de Mistérios, o ritual de
iniciação sempre é fundamental, como foi nas antigas sociedades tribais. Sendo
assim, o tantrismo adquire as formas ancestrais de pensar e atuar, que são
veladas aos não crentes, e possuem suas raízes fincadas nos recônditos do
nascimento da humanidade. A palavra sânscrita para a cerimonia de iniciação é Abhishekha, que significa literalmente borrifar. O iniciado é borrifado com
água batismal em um processo semelhante ao batismo cristão. O ritual se
assemelha ao da coroação de um rei hindu, sendo a participação da água do
Conhecimento como para coroar um novo monarca iniciado nos mistérios búdicos ou
tântricos. Três métodos foram consagrados pelos devotos:
I)
A Recitação de encantamentos
II)
A Realização de danças e rituais
III) A Identificação com as divindades através de uma
classe especial de meditação
O Tantra elaborou um sistema de meditação
sobre as divindades, que possui uma sequencia de quatro passos:
Em primeiro
lugar está a compreensão da vacuidade (sunnyata)
e o fundir da individualidade dentro dessa vacuidade.
Em segundo
lugar o iniciante deve repetir e visualizar sílabas sagradas e mantras.
Em terceiro
lugar o iniciante deve conceber a forma de uma divindade, sua representação
externa, como aparece nas imagens e pinturas.
Em quarto lugar
o iniciado, pela identificação deve incorporar e se converter na divindade.
Nas tradições
tântricas, como no cabalismo hebraico e no seu alfabeto sagrado, o sânscrito é
considerado a primeira língua universal e também sua escrita é sagrada, a
pronúncia do nome de qualquer deus fará com que ele se manifeste e seu poder
opere, já que o nome é a forma audível do próprio deus. A palavra suprema, da
qual todo o Universo visível e invisível emana a sua manifestação absoluta, é na
tradição hindu a sílaba AUM. Ela conecta o iniciante com as energias audíveis
do Universo.
Os rituais
tântricos como nos foram revelados pelos historiadores envolvem a união dos
princípios masculino e feminino para através do orgasmo atingir a plenitude da
potência divina como microcosmo do processo de criação e fecundação universal. O
hierogasmo, a união carnal dos
personagens consagrados à Deusa é descrita, como instruções de culto, nos
textos sagrados:
“Sou Bhairava, o Eu onisciente, dotado de atributos.”
Tendo sido assim meditado, que o devoto
prossiga até a adoração à Kula.
Vinho, carne, peixe, mulher e união sexual:
Estas são as cinco bênçãos que afastam todos
os pecados.
Nesses ritos o objeto sagrado é uma jovem
nua dançando, devota. Prostituta, lavadeira, esposa de barbeiro, mulher brâmane
ou sudra, florista ou leiteira, e a hora tem que ser meia-noite. O grupo deve
ser formado por um círculo de oito, nove ou onze casais nos papéis de Bhairava e Bhairavi. São pronunciados mantras específicos, de acordo com a
classe da pessoa a ser escolhida como Sakti,
que então é adorada de acordo com a regra. Ela é colocada despida, mas
ricamente ornamentada dentro ou ao lado de um círculo de pares de homens e
mulheres devotos, e purificados através de vários mantras. A suprema sílaba
sagrada da ocasião lhe é sussurrada três vezes ao ouvido; ela é aspergida com
vinho, recebe carne, peixe e vinho que abençoa com seu toque e a seguir são
distribuídos entre os crentes ao som dos cânticos sagrados, ela torna-se assim
o instrumento de uma sequencia de atos sacramentais preliminares que culminam
numa consagração geral entre mantras e formas de meditação. Exercícios eróticos
podem acompanhar e encerrar os rituais já que a energia libidinal, a união do
masculino e do feminino criam o uno, a perfeição da harmonia dos opostos, que
proporciona o samadhi para os amantes
iniciados.
As cinco bençãos acima mencionadas são conhecidas como os Cinco Emes: vinho (madya), carne (mamsa), peixe (matsya), mulher (mudra) e união sexual (maithuna). Nos chamados "ritos substitutivos" ou simulacros indicados àqueles que devem adorar a deusa numa atitude antes de criança do que de amante, madya torna-se leite de coco; mamsa, grãos de trigo, gengibre, sal ou alho; matsya, rabanete vermelho, gergelim vermelho, masur (um tipo de grão), a verdura brijal branca e paniphala (uma planta aquática); mudra, trigo, arroz com ou sem casca, e maithuna, um ritual de submissão infantil aos Pés de Lótus da Mãe Divina
Outros rituais de adoração da Deusa envolvem o sacrifício de vitimas humanas e até mesmo a degustação de sua carne. Outros ainda, para a obtenção de capacidades mágicas, exigem que o iogue medite à meia-noite num cemitério, num chão ardente ou num local onde são executados os criminosos, sentado sobre um cadáver; se ele conseguir realizar isso sem medo, os fantasmas e as manifestações de duendes femininos serão seus escravos. Certos crentes “furam sua carne com ganchos e espetos, atravessam suas línguas e bochechas com instrumentos pontudos, deitam-se em camas de prego ou cortam-se com facas”. Os chamados Portadores de Crâneos cobrem-se com as cinzas de uma pira funerária, penduram uma corrente de crânios humanos ao pescoço, trançam os cabelos e usam uma pele de tigre sobre os quadris, levando na mão esquerda um crânio como tigela e na direita um sino que deve ser tocado incessantemente enquanto gritam: “Oh, Senhor e Esposo de Kali!”
Outros rituais de adoração da Deusa envolvem o sacrifício de vitimas humanas e até mesmo a degustação de sua carne. Outros ainda, para a obtenção de capacidades mágicas, exigem que o iogue medite à meia-noite num cemitério, num chão ardente ou num local onde são executados os criminosos, sentado sobre um cadáver; se ele conseguir realizar isso sem medo, os fantasmas e as manifestações de duendes femininos serão seus escravos. Certos crentes “furam sua carne com ganchos e espetos, atravessam suas línguas e bochechas com instrumentos pontudos, deitam-se em camas de prego ou cortam-se com facas”. Os chamados Portadores de Crâneos cobrem-se com as cinzas de uma pira funerária, penduram uma corrente de crânios humanos ao pescoço, trançam os cabelos e usam uma pele de tigre sobre os quadris, levando na mão esquerda um crânio como tigela e na direita um sino que deve ser tocado incessantemente enquanto gritam: “Oh, Senhor e Esposo de Kali!”
Em geral, as
seitas do Caminho da Mão Esquerda repudiam a divisão de castas durante o
momento sagrado do rito. “Enquanto o
tantra de Bhairava está presente na sessão, todas as castas são brâmanes”, lemos em um texto da seita. “Terminada a sessão, elas voltam a ser
distintas.” O Tantra é uma forma de ioga, uma passagem para além dos
limites da esfera do Dharma e em suas
variantes rituais até mesmo as relações de família e os tabus de incesto podem
ser desconsiderados nas sessões orgásticas. Pois se declara “que todos os homens e todas as mulheres são
de uma casta única e que sua relação sexual está isenta de transgressão”. “Afasta
a ideia de dois e sê de um corpo”, lemos num hino que celebra a realização
desse caminho, “muito difícil é esta
disciplina do amor”.
Os cultos
tântricos de Shakti colocam a mulher
no centro do sistema simbólico. Suas principais características são a adoração
das Shaktis, as manifestações femininas com as quais os deuses masculinos, os
seus pares opostos, estão unidos no abraço da união amorosa da unidade. Promovem
a adoração de grande quantidade de divindades aterradoras e do seu deus Bhairava (o Terrível), a personificação
da ira de Shiva, associada
com a completa aniquilação do mal e sua liturgia compreende um ritual
complexo conectado ao mundo dos mortos. A meditação e os exercícios respiratórios
são fundamentais na sua consecução como uma prática de yoga a ser realizada
pelo par de opostos onde o gozo é contido ao máximo para a realização final do
atingimento do Samadhi através da
libertação libidinal. A tradição do Tantra estabelece a presença no
interior de cada ser de todos os deuses e demônios dos céus e infernos oriundos
de todos os patamares da mente.
O antigo
budismo, em seus primórdios, conforme estabelece a tradição ariana, foi um
sistema severamente masculino e somente admitia algumas divindades femininas
bastante subordinadas em seu panteão. Os deuses superiores são assexuados, e
também o são os habitantes dos campos búdicos. A feminilidade era em geral um
obstáculo para o atingimento de níveis espirituais superiores e ao acercar-se
do estado búdico o Bodhisatva deixava de renascer na forma feminina. Acreditavam
que não era possível que uma mulher se convertesse em Buda.
Prajnaparamita e Tara foram as primeiras divindades budistas autônomas. O culto de Tara parece ter sido incorporado ao
budismo por volta de 150 d. C. Tara,
do sânscrito “Taraiati” é a divindade salvadora que nos ajuda a
cruzar a outra margem do rio, que elimina o medo e o temor e que outorga o
cumprimento de nossos desejos. Tara é
criação da imaginação popular, como não poderia deixar de ser, já que o
imaginário do inconsciente coletivo exige a figura do culto ao feminino e da
psicopompa. A Prajnaparamita por
outro lado originou-se como conceito
em pequenos grupos de ascetas metafísicos. Na corrente Mahayana, não era só um
atributo ou virtude, um livro ou um mantra, senão também representava uma
divindade. A personificação da sabedoria transcendental parece ter começado por
volta do começo de nossa era. Nos sutras
de Prajnaparamita é descrita como “a Mãe de todos os Budas”. Qual é o
significado dessa expressão? Da mesma maneira que uma criança nasce da mãe,
assim a iluminação completa de um Buda vem da Perfeição da Sabedoria. Ela é a
manifestação que lhes ensina a andar pelo mundo. Desta forma um principio
feminino foi colocado ao lado do Buda, e até certo ponto acima dele. É
interessante notar que os textos de Prajnaparamita
tiveram origem no Sul da Índia, de onde o meio drávida, mais antigo, havia
mantido vivas várias ideias matriarcais, que o bramanismo, mais exclusivamente
masculino, havia suprimido no Norte da Índia. Quase em todas as culturas
podemos encontrar no pensamento antigo o conceito que representa o principio
feminino como a sabedoria que combinava a maternidade e a virgindade. No mundo
mediterrâneo é a Sofia que vem representar de forma similar esse conceito, que
está diretamente relacionada com os antigos cultos à Ishtar, Ísis, Palas Atena,
Minerva e Astartéia. Essa concepção feminina representa uma fusão da ideia de
Sabedoria com a da Magna Mater, e é adorada sempre ao lado do ser supremo
masculino. Como Ishtar e a Virgem Maria , a Prajnaparamita
era em essência tanto mãe como virgem.
Isso quer dizer que é fértil, frutífera em seus bons atos e suas imagens
realçam a plenitude de seus seios, como provedora. Por outro lado, igual a uma
virgem, permanece intocada, intacta, inapreensível.
É impossível não
mencionar os Mistérios de Elêusis, consagrados em seu templo na Grécia ao culto
de Démeter e Perséfone. A primeira uma deusa agrária responsável pela fecundação
da terra e cujo nome sugere a maternidade e a segunda, sua filha raptada e aprisionada no submundo do Hades como
deusa infernal. Sendo que ambas as personificações são uma só conjugação manifestada dos atributos
da Deusa. Nas cerimonias Dioniso era parte integrante desses mistérios. Nunca saberemos quais eram os rituais iniciáticos de revelação que
ocorriam dentro do templo, mas pelos relatos dos antigos sabemos que estavam
diretamente relacionados com a morte e o mistério da transmigração da alma.
Seus adoradores adquiriam o conhecimento que se revelado para estranhos levaria à morte do
iniciado.
Observando
todos esses aspectos do tantrismo, desde suas cerimonias orgiásticas e rituais de iniciação,
até a compreensão do principio feminino como conceito primordial da sabedoria
chegamos ao ponto mais importante dos segredos ocultos do passado distante, de
todas as religiões de mistérios elaboradas pela humanidade ao culto da deusa. O
que os antigos estudiosos buscavam ocultar é o potencial gerador do feminino e
a ligação indispensável do pensamento sobre a Criação com o poder da mulher em
suas liturgias. Esse é o grande segredo do ocultismo. A conceituação da virgem
que concebe, que nos parece contraditória, à luz da ciência hoje tornou-se a
mais absoluta realidade dentro das novas técnicas de inseminação. A genética nos ensina que os fatores que levam ao
desenvolvimento do macho no útero, o cromossoma Y é uma ínfima mutação da fêmea,
e que o desenvolvimento genital masculino é apenas um avantajamento dos órgãos
reprodutores femininos em sua fisiologia. Por analogia, como os sábios do
passado puderam observar, a força primordial do Universo está associada às
potências femininas primordiais e que são base da vida no planeta e talvez a
base da verdadeira semente que originou todo o mundo fenomênico em suas
atividades primordiais no primeiro segundo do Big Bang. É disso do que se trata o
Tantra, o culto ao fator gerador das 10 mil coisas, a união dos opostos onde é
o masculino o complementar, mas é o feminino o indispensável para a preservação
da vida cósmica. Com a destruição dos bosques sagrados na Europa e o incêndio proposital
do templo de Elêusis pelos fanáticos cristãos, adoradores de seu deus masculino,
e que abominavam a sexualidade como coisa pecaminosa todos esses conhecimentos arcanos foram velados, até que o avanço da ciência pudesse demonstrar uma verdade
indiscutível. Apesar do culto oficial a uma trindade amorfa pela Igreja o povo
consagrou o culto à mãe do Cristo, da mesma forma que os antigos pagãos
adoravam Ísis e suas respectivas manifestações, ecos do mais remoto
conhecimento da humanidade e de seu inconsciente coletivo, a verdadeira herança
da sabedoria milenar.
No Livro dos
Mortos tibetano a alma é aconselhada pelo lama assistente a reconhecer como
projeções de sua própria consciência todas as formas vistas, tanto as
celestiais quanto as infernais, e quando as cenas do inferno estão prestes a
surgir, o lama diz:
“Não tenhas medo, não tenhas medo, ó tu, de nobre nascimento! As fúrias do Senhor da Morte colocarão uma corda em volta de teu pescoço e o puxarão; cortarão tua cabeça, extrairão teu coração, arrancarão teus intestinos, sugarão teus miolos, beberão teu sangue, comerão tua carne e roerão teus ossos; mas em verdade teu corpo é da natureza do vazio; tu não precisas ter medo”.
“Não tenhas medo, não tenhas medo, ó tu, de nobre nascimento! As fúrias do Senhor da Morte colocarão uma corda em volta de teu pescoço e o puxarão; cortarão tua cabeça, extrairão teu coração, arrancarão teus intestinos, sugarão teus miolos, beberão teu sangue, comerão tua carne e roerão teus ossos; mas em verdade teu corpo é da natureza do vazio; tu não precisas ter medo”.
“Não
fiques aterrorizado; não fiques assustado. Se todos os fenômenos existentes –
que brilham e se irradiam como formas divinas - forem reconhecidos como
emanações da própria mente, o Estado de Buda (Samadhi) será alcançado nesse
mesmo instante. [...]Aquele que reconhecer suas próprias formas-pensamento
através de um ato importante e através de uma palavra, atingirá o Estado de
Buda.”
Akasha-Bhairava |
1) El Budismo - Edward Conze - Fundo de Cultura Económica - México - 1997
2) As Máscaras de Deus, Mitologia Oriental - Joseph Campbell - Ed. Palas Athena - 5º ed. - 2004
3) As Máscaras de Deus, Mitologia Primitiva - Joseph Campbel - Ed. Palas Athena - 1992
4) História das Crenças e das Ideias Religiosas - I - Da Idade da Pedra aos Mistérios de Elêusis - Mircea Eliade - Ed. Zahar -2010
Nenhum comentário:
Postar um comentário